REGRESSÃO DE MEMÓRIA RECORRENTE NA
UFOLOGIA
Por Gordon Bates
Introdução
Esta é uma crônica a respeito de uma
ideia que não abandona a ufologia, por mais que se colham os pareceres e as
análises de profissionais da saúde mental. A Hipnose surgiu na década de 1960
como uma tábua de salvação para a completa ausência de provas das abduções. Não
é necessário reprisar as icônicas sessões de regressão de memória que o
psiquiatra americano Benjamin Simon levou a efeito com o casal Hill.
A regressão de memória ou de idade
passou a ocupar os métodos de comprovação na ufologia, ainda que não sejam
próprios dela, vez que os meios de prova existem para que deles se utilizem
quaisquer áreas que necessitarem evidenciar suas proposições. Enquanto a
hipnose em si é mesmo uma técnica interessante para algumas correntes
alternativas de tratamento psicológico, usada por psicoterapeutas, a regressão
de memória é uma prática pontual e se tornou para a ufologia uma forma de
seguras afirmações. Que no fundo são inseguras.
Agora, com a constante divulgação do
Caso Varginha, que não cessou nem cessará ao que tudo indica, a regressão de
memória volta ao palco, com ufólogos – leigos ou profissionais de saúde mental
– mantendo essa sua ideia insistente e recorrente. Consta que duas das
senhoras, as primeiras testemunhas do Caso, estão sendo ou serão submetidas a
sessões de regressão e o protagonista da suposta queda de uma “nave”, na
Fazenda Maiolini, Município de Três Corações, MG, em 13 de janeiro de 2020, já
foi sujeito de uma primeira sessão hipnótica, registrada em um vídeo de uma
hora e vinte e sete minutos.
A Hipnose como Suposta Técnica
Eficaz
A Hipnose, em sua prática de
regressão de memória, é meio que comprova a veracidade de casos ufológicos e de
quaisquer casos. Assim enfatizam ufólogos. Chegam a dizer que no Brasil ela é
utilizada judicialmente, para comprovação de ocorrências criminais. Quando
usada na Justiça, o que é raríssimo, não pode ser escolhida para um julgamento,
uma Sentença. É inadmissível qualquer meio que evite a livre expressão do Réu. Portanto
equivocam-se ufólogos que dizem o contrário. Essa crença é um exagero
destinado a sustentar ideias
irredutíveis quanto á regressão de memória. O que em dialética, em termos de
raciocínio, é chamado de viés de confirmação.
É maioria entre os estudiosos,
leia-se psicólogo, psiquiatra ou até mesmo psicanalista, que a hipnose, se bem
aplicada em nível ou grau de transe profundo, retrata tão somente a realidade
subjetiva do hipnotizado. Isto é, sua realidade própria, que ele vivenciou e
por vezes em razão de fatores nada objetivos. O hipnotizado narra durante a
regressão a realidade em que ele acredita. Ela pode ter sido moldada por
sonhos, por alucinações, por má interpretação de certos fenômenos e até mesmo
pela crença religiosa. Jamais se presta a à comprovação científica de abduções,
visões de UFOs (atualmente UAPs) e similares.
A Influência do Hipnotizador e do
Meio Ufológico no Hipnotizado
Este trabalho atem-se à regressão de
memória divulgada no meio da ufologia como tentativa de resgate de lembranças
que envolvam a real queda de uma “nave” em 13 de janeiro de 1996, na Fazenda
Maiolini, Município de Três Corações, MG, cujas nuances são conhecidas da
ufologia brasileira.
Um hipnólogo que visasse descobrir
essa suposta realidade objetiva teria de ser antes de tudo alguém completamente
ausente dos meios ufológicos. A separação entre o que o hipnotizado acha que
presenciou e essa realidade é extremamente complicada. A ufologia vive de
divulgar seus gloriosos e heroicos feitos, contando para isto com o testemunho
de pessoas que se dizem abduzidas ou simplesmente presenciais de algumas
ocorrências. Este último era o caso da testemunha agora comentada, o da Fazenda
Maiolini, que de repente se tornou um abduzido e um contatado.
A diferença entre testemunha e
contatado foi explicada pelo falecido ufólogo francês Henry Durrant (“Primeiras Investigações sobre os Homanóides
Extraterrestres”. DURRANT, Henry. São Paulo: Hemus, 1980, PÁG. 222). Ele relacionou
sete pontos em que Testemunhas e Contatados diferem em seu comportamento. Em
resumo, a Testemunha paraticipa do fato por acaso, por surpresa e o Contatado é
atraído ao local, recebe mensagem mental e vai por alguma razão inexplicável; a
Testemunha sofre uma experiência desagradável, objetiva e fria, enquanto para o
Contatado ela é maravilhosa e vem sucedida por mensagens de cunho filosófico
(!) ou transcendente; a Testemunha pode contar com depoimentos de terceiros que
tenham avistado algo e que corroborem suas declarações, ou o local apresenta
algum mero indício material da ocorrência, mas o Contatado não conta com nada
disto.
Não se
creia que aqui estejamos misturando instâncias, ao subtitularmos que há uma
influência do hipnotizador e do meio ufológico,sobre as testemunhas. Adiante será
notada a razão.
Muitas
testemunhas do Caso Varginha tornaram-se com o passar dos quase 30 anos uma
verdadeira mescla dessas características acima mencionadas. Para justificarmos
esta observação, passamos a reproduzir as 6ª e 7ª diferenças detectadas pelo
saudoso ufólogo. Preste bastante atenção o leitor entusiasta da ufologia e do
Caso:
“6. Testemunha: faz uma narração coerente
mesmo que seja inacreditável; não tenta enriquecê-la com detalhes ou com uma
´sequência´com o passar do tempo. Contatado: faz nararrações que, apesar de
coerentes originalmente, se tornam cada vez mais complicadas e incoerentes à
medida que vão sendo aumentadas com detalhes
7. Testemunha: não gosta de falar de sua experiência, pelo contrário,
procura geralmente evitá-la. Seja o que for, não costuma encontrar uma base
para defender um credo; não dá conferências e não escreve livros;
resumindo, entra na obscuridade da sua vida privada, de onde saíra momentânea e
involuntariamente. Contatado: gosta de falar de sua experiência e por vezes
constroi a base de um verdadeiro sermão pessoal; dá conferência e escreve
livros e afirma também que nada recebeu pelas informações publicadas. Independentemente desta última componente de
caráter pecuniário, de importância determinante para fins de difusão da
mensagem sempre mais ampla da mensagem dos Extraterrestres presumíveis, procura
aumentar tanto quanto possível a sua própria popularidade fazendo publicidade
do seu caso, por todosos meios que lhe sejam possíveis”.
As testemunhas submeteram-se durante
27 anos a uma saraivada de ideias ufológicas. O contato delas com ufólogos
ampliou-se consideravelmente em número e em linhas de pensamento, a partir do
instante em que começaram a aparecer na Imprensa, e protagonizam o caso mais
rumoroso da ufologia mundial depois de Roswell. Todos esses ufólogos, sem
exceção, ao menos à época do caso adotavam ferrenhamente o viés da “nave
extraterrestre”. Pensamento que tornou a ufologia o sinônimo de uma área que
insiste por demonstrar que estamos sendo visitados por civilizações extraterrestres
avançadíssimas. Quando entram em campo estudiosos que se dedicam a técnicas
discutíveis, polêmicas e insípidas, como a Hipnose Regressiva, a influência se
torna mais concreta.
Os fatores intrínsecos a cada
testemunha, suas crenças, cultura pessoal, formação, seu quadro psicológico e
até psíquico, compostos de vários outros aspectos pertencentes à subjetividade da
pessoa, misturam-se ás crenças, finalidades, vieses, dos próprios ufólogos.
Dentre estes, os hipnotistas ufólogos. Os hipnotistas para quem a regressão de
memória é técnica infalível ao encontro da verdade. Porém não distinguem o que
decorra da verdade íntima, da verdade interna, da verdade subjetiva, de cada
testemunha ufológica hipnotizada.
Testemunhas e contatados não compõem
sozinhos esse mundo extraordinário. Tão importantes à construção de uma
realidade ainda longe de ser demonstrada como objetiva, são os próprios
ufólogos. Não se pode separar o conjunto de fatores que constituem as atitudes
e o comportamento das testemunhas e dos ufólogos. O mundo dos “discos voadores”
é da testemunha e do ufólogo. E este não age somente como estudioso, pelo que não
se diga que seja óbvia a participação do experimentador. Em ufologia, o
experimentador se confunde com o objeto experimentado muito mais do que isto
costuma ocorrer em verdadeiros experimentos científicos.
De Como o Hipnotizado Adota a
Ideia do Hipnotizador
A sessão hipnótica foi levada a
efeito na data de 04.12.2022, em Peruíbe, SP, por um dedicado hipnotizador, que
apesar de não ter formação em qualquer área da saúde mental, detém uma extensa
coleção de certificados de temas paralelos aos acadêmicos, cujos objetos e
fundamentos não são para discussão aqui. O hipnotizador forneceu a gravação da
sessão hipnótica cujas primeiras imagens mostram uma poltrona com uma grande
“cabeça de ET”, aquele desenho que se tornou símbolo ou ícone de
extraterrestres, com face triangular e comprida, com dois grandes olhos negros.
A importância disto é que desde o ambiente o hipnotizado se vê envolvido por um
clima relacionado a supostos extraterrestres. Que muita gente acredita serem
tripulantes de Discos Voadores,“greys” que compõem os anais ufológicos em
incomodativos casos de abdução.
Carl
Sagan ironiza o fato de que acontece um sem número de abduções noturnas, contudo
jamais foi disparado sequer um sofisticado alarme de residência. Destaca que de
acordo com a ufologia estaríamos diante de um caso para cada fração de minuto. Ou
seja, mais de 100 milhões de abduções. Entusiasmados ufólogos parecem desprezar
essa matemática em favor das afirmações que visam convencer de que estamos
sendo visitados – e abduzidos – em número a cada dia crescente. O resultado é
que muita gente passa a acreditar que foi abduzida, para justificar problemas
afetivos de toda sorte e da ânsia de se tornarem de importância messiânica.
Abduzidos
procuram terapeutas e hipnotizadores, quando não se dá o inverso. Ufólogos
procuram exasperadamente a testemunha ufológica abduzida. A hipnose trará à
tona do consciente o que foi canalizado e esquecido, vale dizer recalcado,
permitindo ao inconsciente (na verdade ao sub ou pré-consciente) que deixe
transbordar tais fatos. O problema é sério e se divide em dois aspectos.
Primeiro, se a testemunha foi realmente hipnotizada, ou seja, se entrou em
transe propício à realização de uma Regressão de Memória legítima, ou se apenas
se submeteu a uma concentração consciente para ficar mais atenta à sua memória. Ou se a
testemunha não fingiu o transe, para agradar a ambos – a ela própria, que se
diz abduzida ou adoraria sê-lo, e, claro, ao ufólogo hipnotizador. Há uma certa
complexidade nisso.
Sagan
termina em seu obrigatório “O Mundo Assombrado pelos Demônios”, alertando que
os terapeutas ou hipnólogos dedicados a abduzidos anunciam seus serviços de
forma escancarada, por vezes pelos meios mais eficientes de propaganda. De
seus cartões de visita consta sua
especialidade no trato com abduzidos por ETs. Esse absurdo, que deveria ser
evitado como um fator primário de influência nos pacientes, com o fito de se
estancar ao máximo as FALSAS LEMBRANÇAS, são orgulhosamente exibidos por
célebres estudiosos/ufólogos. A exemplo de David Jacobs. E do mais famoso, o
falecido psiquiatra de Harvard, John Mack. Mack esteve por algumas horas em
Varginha ouvindo as três então meninas que acenderam o estopim do Caso.
Quando esses profissionais
procuram potenciais abduzidos, avisam e por vezes até prometem que lhes tirará
do esquecimento o que ocorrera durante a extraordinária experiência,
passo-a-passo. É o que basta para a criação, independentemente dos sofistas
criadores de justificativas, de FALSAS LEMBRANÇAS.
Ao
invés disto esses profissionais deveriam agir cientificamente, ou seja, evitar
a qualquer custo toda a influência no
hipnotizado, antes e depois da sessão hipnótica. O que é muito difícil,
quase impossível, tornando assim a técnica da Regressão ABSOLUTAMENTE INVÁLIDA
à busca de uma realidade objetiva, ou à comprovação de que humanos sejam
abduzidos por seres de fora. Neste ponto Sagan volta a ironizar – esses
estudiosos deveriam ser mais realistas com os seus pacientes (“O Mundo Assombrado pelos Demônios”. SAGAN, Carl.
São Paulo: Companhia das Letras, 1997, PÁG. 173).
O avistamento do comentado hipnotizado teria
ocorrido em 1996 e desde aquele ano a grande repercussão do Caso Varginha tem
provocado um verdadeiro assédop à percepção das testemunhas. Que se dá por
publicações na imprensa escrita, falada, televisada, por meio de documentários
produzidos no Brasil e no exterior. O destaque vai para o excelente “Moment of
Contact”, de James Fox, um profissional da mainstream
que, muito bem assessorado pelo ufólogo e produtor brasileiro, Marco
Aurélio Leal, é dedicado ao tema ufológico. A testemunha hipnotizada passou por
vários dias com James Fox nos Estados Unidos da América e teve participação de destaque
no citado documentário.
Por
cerca de trinta anos a testemunha sofreu a influência de todo o aparato de
divulgação não apenas do Caso mas da ufologia em geral, que a cada dia se torna
um promissor nicho de audiência. Vez que a participação do ufólogo – no caso o
hipnotizador – não se separa, formando ambos um conjunto “de psiques”, há de
ser discutido quem tem credencial e conhecimento suficiente para aplicar uma
Regressão de Memória.
Lidar
com a psique, com a mente, não é fácil nem é de mero deleite. Não há no Brasil
uma Lei que proíba a aplicação da Hipnose pelo leigo em saúde mental. Contudo
não é necessário que a legislação traga expressamente certas acepções em suas
letras. Os estudantes e os operadores do Direito sabem disto. Caso contrário, o
Direito seria, por absurdo, uma ciência exata e as Leis não comportariam
interpretações nem extensões em sua aplicação. Havia uma apelidada “Lei de Jânio
Quadros”, que proibia o uso da Hipnose pelo não formado em áreas da saúde, bem
como sua exibição e espetáculos públicos. O respectivo decreto foi revogado
pelo Presidente Fernando Collor de Melo e a partir de lá toda sorte de
aventureiros, e de estudiosos sérios é claro, passaram a se considerar useiros
e vezeiros da Regressão de Memória. Até para “além” da vida intrauterina, o que
desafiaria outro enfoque de discussão, sobre o Além, com o devido respeito.
Ao se enfocar a legislação brasileira, considerando-se a
competência dos Órgãos de Classe conferidos pelo ordenamento jurídico, somente
profissionais de atuação regulada pelos Conselhos de Medicina, Psicologia,
Odontologia e Terapia Ocupacional, são autorizados a utilizar o Hipnotismo como
terapia, ou seja, como método clínico. Todavia, a maioria de hipnotizadores age
prometendo ou insinuando uma finalidade terapêutica. Essas sessões de Regressão
geralmente se iniciam com ditos como “traremos
de seu inconsciente tudo aquilo de que você não se lembra”. Aqui quase
esbarrando em um primário adágio da Psicanálise. Ou “sua experiência [que é do óbvio conhecimento de ambos] vai ser agora conhecida do começo ao fim, na sequência
certa”. Frases desse tipo são tão certeiras, de influência tão concreta,
que soam como se ditas ao inverso – você dirá conscientemente aquilo que não
sabe; agora vamos construir sua história, do começo ao fim.
A Hipnose pode fazer construções irreais, criar falsas
lembranças, incutir realidades que não apenas as experimentadas por sonhos,
alucinações ou enganos de sensações. Basta que o hipnotizador escolha as
palavras certas. Ou diga palavras que são tão erradas que jamais deveriam ter
sido ditas. O que é quase impossível na prática. Portanto a Hipnose Regressiva
não é técnica que garanta a descoberta da realidade almejada pela ufologia. Os
mais respeitados institutos ou estudiosos da Hipnose sabem dessa ineficácia da
Regressão de Memória e somente os ufólogos insistem pelo contrário, que
representa suas próprias ilusões. Inclusive quando utilizada como técnica clínica alternativa, a Hipnose
Regressiva é empregada para resolução de certas fobias, tratamento de alguns
sintomas de estresse pós-traumático e sintomas psicossomáticos, mas não é tida
como buscadora de nenhuma verdade objetiva. E sim da realidade íntima, subjetiva,
que possa provocar o sofrimento do paciente e procurar debelá-la.
Pode o Hipnólogo, enquanto Ufólogo, Aplicar Hipnose
Regressiva?
O Conselho Federal de Psicologia publicou a
Resolução CFP n. 013/2000, de 1º de setembro de 2000, evocando suas atribuições
legais e regimentais, que lhe foram conferidas pela Lei N. 5.766, de 20 de
dezembro de 1971. Para a Psicologia no Brasil, a Hipnose é técnica de recurso
auxiliar no trabalho do Psicólogo. Assim, ela é recurso coadjuvante em razão de
suas possibilidades técnicas do ponto de vista terapêutico. Estas são as
palavras do preâmbulo da Resolução. Enfatiza o Conselho que a Hipnose
Ericksoniana (criada pelo psiquiatra
norte-americano Milton Hyland Erickson) tem aplicação prática no campo
psicológico, que a Hipnose é reconhecida na área de saúde como um recurso capaz
de contribuir nas resoluções de problemas físicos e psicológicos. E vem o mais
incisivo e importante: considerou o Conselho que a Hipnose
reconhecida pela Comunidade Científica Internacional e Nacional como campo de formação
e prática de psicólogos. Os Artigos 1º e 2º dessa Resolução dão o uso da
Hipnose como recurso auxiliar de trabalho do psicólogo, bem como que o
psicólogo poderá dela recorrer, desde que possa comprovar capacitação adequada,
nos termos do Código de Ética Profissional dos Psicólogos. Não é necessário
argumentar mais.
O
hipnotizado estava mesmo em transe? Se estava, então a Regressão feita em grau
profundo prova uma abdução? Se esta última alternativa for presente, a Hipnose
serve para provar exclusivamente a sinceridade da testemunha. Que não está fingindo,
vale dizer, que não está inventando história no momento da sessão, seja com que
finalidade for. Bom repetir, para que costumeiros equivocados não venham com
propositais “erros” de interpretação – SE, CASO, a pessoa estiver realmente
hipnotizada e em grau propício à realização da Regressão, ela “reviverá” sua
experiência de abdução, mesmo que simplesmente imaginada ou elaborada por
alguma razão. Se estiver em transe
profundo, não apresentará narrativa falsa, isto é, não mentirá, pois que o
transe legítimo não permitirá isto.
Há
meios praticamente infalíveis para se saber se o transe existe ou se a pessoa
não está simplesmente colaborando. Testes simples, conhecidos da Hipnose
clássica, antes mesmo de o psiquiatra Milton Erickson ter criado suas formas de
relaxamentos profundos que permitem melhor concentração para resgate de
memória. Ainda que, realmente, provoquem alterações nas ativações de partes do
cérebro. O desconhecimento de questões “superficiais” do assunto podem levar
ufólogos a outros equívocos, tais como o de achar que as alterações cerebrais
durante o transe provem que a experiência de abdução foi uma realidade
objetiva, ao passo que foi apenas subjetiva. Não é porque o transe legítimo
provocas alterações de atividade cerebral, que a pessoa esteja revivendo um
fato externo atribuído ao sequestro (ou rapto...) por seres extraterrestres.
Veja o que informa a própria Hipnose Ericksoniana a
este respeito. O início da técnica se dá com um relaxamento induzido, em que, no início da indução o hemisfério cerebral esquerdo
sofre ativação. Depois, no Transe Leve, ocorre diminuição da atividade no lobo frontal esquerdo,
responsável pela racionalidade. Segue-se relaxamento muscular, peso ou leveza
em partes do corpo, respirações mais longas.
Pelo Transe Mèdio,
acontece diminuição progressiva da atividade do giro frontal superior esquerdo,
diminuindo a resistência e aumentando a capacidade de pensamento dedutivo.
Também se dá ativação bilateral dos lobos occipittais, com aumento da
imginação, da capacidade de visualizações, do acesso a informações e da
capacidade criativa. O paciente manifesta retardamento na atividade muscular,
possível aumento isolado das sensações e alteração no reflexo de engolir.
Com o Transe Profundo, o
paciente acusando odores, visões com memória de emoções, pode sofrer
alucinações e reage emocionalmente à dor, com analgesia ou anestesia, podendo
ser induzido a sonhos. Este é o bom estado para se fazer uma Regressão de
Memória. Mas seria legítima enquanto demonstração de uma abdução verdadeira?
Basta que se releiam as reações acima para ver se a Regressão é mesmo crível.
É desnecessário levar-se
um paciente a novas regressões perante universidades mundialmente consideradas
pelo meio acadêmico-científico, apenas para mostrar que as atividades cerebrais
do hipnotizado se alteram durante o transe. Porque isto está longe de poder
provar uma abdução por ETs.
O psicólogo americano Stephen Paul
Adler, festejado por ufólogos hipnotizadores, considera que a Regressão de
Memória permite conduzir o cliente de volta no tempo para alguma experiência
com o intuito de revivè-la (Revivificação). "A regressão de idade nos dá a oportunidade de
viajar de volta no tempo para recuperar memórias esquecidas, ou para
'retrabalhar' antigas memórias no intuito de chegar a novas conclusões" (Act
Institute, https://actinstitute.org/curso/hipnose-ericksoniana-avancado-regressao-e-progressao-de-idade/). Retrabalhar antigas memórias, para que se
chegue a novas conclusões... novamente é desnecessário comentar. Outros
estudiosos não acham bem isto. Segundo o neurologista Marlus Vinícius Costa
Ferreira, "a veracidade total dos dados obtidos pela regressão de idade
é ainda discutível, podendo representar realmente dados originais de estímulos
passados; dados que representam a resultante de estímulos registrados
anteriormente; dados que representam respostas às sugestões formuladas pelo
hipnólogo no momento presente; ou uma mistura de todas as possibilidades" (Citado
em https://br.mundopsicologos.com/artigos/regressao-de-memoria-no-contexto-terapeutico).
Vem à baila um comentário do médico
Maury Machado Dias, no livro “Teoria e Prática da Hipnose”, Civilização
Brasileira, Rio de Janeiro, 1976, p.7. “A hipnose é uma arma terapêutica. Psicoterapêutica. Tão
útil quanto muitas outras e tão ineficaz quanto todas as demais... Corretamente
indicada, corrige, equilibra, soluciona problemas. Aplicada indiscriminadamente
é tão inútil quanto o antidiarreico prescrito para uma cefaleia”. A conclusão de que somente o
profissional de saúde deve ter a Hipnose como uma de suas atividades está
sempre justificada.
É
quase impossível relacionar os inúmeros hipnoterapeutas brasileiros. A a médica
e psiquiatra Sofia Bauer é um exemplo. Na PUCRS a Hipnose Médica é aplicada, vez que reconhecida pela Organização Mundial
de Saúde como prática terapêutica utilizada em áreas de atuação na saúde
humana. Seus cursos visam habilitar médicos, dentistas, psicólogos e
outros na prática da hipnose terapêutica. A PUC SÃO PAULO também mantém um curso
de Hipnose Clínica. Na USP, núcleos criados pelo Instituto de Psicologia sob a
coordenação de Wellington Zangari estudam a Hipnose, além de fenômenos tidos
por anômalos.
Fundamenta-se o entendimento de que apenas profissionais
de saúde podem se dedicar à aplicação da hipnose, pois que esta tem efeito
clínico e lida com os recônditos da psique alheia. Sugere-se a leitura das
atribuições do Psicólogo no Brasil, no CBO – Catálogo Brasileiro de Ocupações
do Ministério do Trabalho e Emprego, sob a classificação 0-74. Relaciona o que
pode ser afeto à psique, ou seja, análise de processos intrapessoais,
mecanismos de comportamento, características afetivas, intelectuais, sensoriais
ou motoras, psicoterapias, fatores determinantes na ação do indivíduo, procede
à formulação de hipóteses e à sua comprovação experimental, observando a
realidade e efetivando experiências de laboratórios e de outra natureza;
sobretudo analisa e diagnostica problemas ou distúrbios de natureza psíquica. E
muito mais. Atividades que não podem, não devem e não são compreendidas pelo
leigo.
Outro resumo. O psicólogo tem
condições de determinar o quadro psicológico de um paciente, para submetê-lo à
Hipnose Regressiva. Até por questão de cautela, em razão de várias
inconveniências, tais como o paciente manifestar a chamada “neurose
experimental”, ou fazê-lo reviver uma situação ou fato traumáticos, que a
psique lutou de forma sofrida para, por meio de recalque, evitar a continuidade
de sintomas.
Não deve o leigo aplicar Hipnose
Regressiva. Até porque, não se submete à ética própria dos psicólogos, ficando
à vontade para gerar prejuízos no hipnotizado, perigo que existe em meio a
outros apesar de hipnotistas somente empíricos espalharem erroneamente que não.
O Código de Ética do Psicólogo reza, por exemplo, que é proibido que o
profissional tente induzir o paciente, baseado em crenças próprias.
Conforme adiantado, a Hipnose era
regulamentada pelo Decreto n. 51.009, de 22.07.1961, conhecido como “A Lei de
Jânio Quadros”. Proibia o uso da hipnose em espetáculos de todo tipo, em
clubes, auditórios, palcos, estúdios de rádio e TV. O Presidente Collor o
revogou através do decreto N º 11 de 19/01/1991. Em 1999, o Conselho Federal de
Medicina emitiu um parecer sobre a Hipnose Médica (Parecer CFM nº 42/1999), recomendando que os profissionais de
saúde utilizassem o termo Hipniatria,
para diferenciar a Hipnose Médica, com fins terapêuticos. A Hipnose para os Odontólogos está regulamentada
pela Lei N º 5.081 de
24/08/66, no art. 6º, par. I-VI. Sugere-se que a seguinte fonte seja
consultada:
http://www.psicologia10.com.br/aprendapsicologia/hipnose-e-legislacao/
Seguindo
a Linha da Regressão Ineficaz para a Ufologia
A Hipnose não é técnica que garante a
descoberta de realidades externas ao indivíduo, vale dizer, que seres
extraterrestres a bordo de “naves” o tenham sequestrado e depois devolvido, ou
mesmo assolado seu sono com uma abdução sofrível. A principal razão é que pode
facilmente, com um mínimo de palavras, gestos o mesmo de situações que insinuem
sua finalidade, provocar Falsas Lembranças. REIS, Carlos Alberto &
RODRIGUES, Ubirajara, trataram das falsas lembranças em várias páginas do seu
“A Desconstrução de um Mito” (São Paulo: Ao Livro Pronto, 2010). Recentemente
publicaram em Portugal, na revista da Universidade da Beira Interior (2021), extenso
artigo dedicado à matéria, com o título “Falsas Lembranças nas Pseudociências e a Inadequação
Da Hipnose na Reconstituição da Memória”, em que enfatizam a presença de Falsas
Lembranças que influenciam o comportamento e a própria constituição psíquica. “Pessoas relatam
fatos aleatórios com enredos ricos, coerentes e complexos, cujo exame atento,
porém, revela estarem à parte da realidade objetiva. Vale dizer, elas não
experienciaram o que alegam ter vivido, sendo, na verdade, elaborações,
histórias e fabulações que ouviram, leram e até tomaram conhecimento, mas não
como protagonistas. São situações engendradas pela psique em razão de
influências, sugestões, emoções, devaneios, fantasias, crenças, volições e
ilusões de toda sorte, tamponando lacunas que a memória não tem condições de
preencher. Fatos que não podem mais ser resgatados são substituídos pela
própria dinâmica da mente, que não sobrevive no vazio”.
Por sua vez, a respeitada psicóloga norte-americana,
ELIZABETH LOFTUS, é considerada a maior autoridade do mundo no estudo de falsas
lembranças. De sua biografia, consta que é uma psicóloga cognitiva especializada na memória humana.
Ela coordenou diversas pesquisas sobre a maleabilidade da memória e é conhecida
pelas suas descobertas inovadoras sobre o efeito
da desinformação e a memória de testemunhas oculares, bem como a criação de falsas memórias. É o que contém o verbete na Wikipedia. Quanto à
intervenção do estudioso, ou ufólogo hipnólogo, é bem vindo o pensamento de
Loftus, quando defende a tese e se apoia em experimentos de uma “reestruturação
mnemônica dirigida”. Isto serve à implantação de lembranças falsas, prosseguem
Reis & Rodrigues, durante a regressão de idade e podendo ocorrer a
implantação de falsas lembranças até em quem não for hipnotizado,
independentemente de seu senso crítico. Segundo os autores, que evocam Loftus,
perguntas recorrentes como as que se fazem na ufologia, com exibição de
desenhos ou fotos, no intuito de ajudar o sujeito a se lembrar, “induzem ou conduzem o depoimento na direção
desejada: é o uso de palavras associadas – sistema DRM (Deese-Roediger-McDermott),
contrariando o que se espera de uma investigação isenta”. Trata-se de
procedimento usado em Psicologia Cognitiva para estudar a falsa memória, com
sigla formada pelos sobrenomes de James Deese, Henry Roediger e Kathleen
McDermott, desenvolvedores do método.
Enquanto a ufologia viver da
pura subjetividade de testemunhas e de ilusões de ufólogos, não receberá a
atenção da ciência. Que é o sonho desesperador da maioria dos estudiosos do
ramo, ávidos de concretizarem seu irrefreado instinto messiânico.
A
Regressão de Memória Realizada com a Testemunha da “Queda”
Além da existência, no
ambiente da sessão, de ítens que remetem imediatamente a supostos
extraterrestres abdutores (ou abducentes, há controvérsia quanto ao termo), que
funcionam como importante fator de sugestionabilidade, antes há que se saber se
houve ou não um transe hipnótico autêntico, como já afirmado.
O vídeo da Regressão aqui comentada,
aplicada em 04 de dezembro de 2022, já se inicia com os primeiros passos da
hipnose, com o sujet sendo submetido
a um relaxamento físico e mental, o que ambos os métodos (ericksniano ou
clássico) utilizam. O vídeo corta para cena de se encontrarem de pé,
experimentador e experimentado, este consciente, em que há uma série de
comentários sobre o que é o estado hipnótico, transe e sua finalidade. O
hipnotizador não titubeia: “Eu serei só
um GPS”, ao explicar que o hipnotizado será conduzido por ele, ao invés de
este agir aleatoriamente no tempo e nos fatos (aos 00:01:17 do vídeo). O
presente trabalho poderia parar por aqui, se uma espécie de radicalismo pudesse
colocá-lo na condição de entender tais ditos do hipnotizador como uma expressa
declaração de que produz no experimentado informações sobre o avistamento (ou
mais...) que a Regressão tentará resgatar.
Inicia-se a fixação do olhar, gestos
à frente da testemunha, tudo como fator sugestivo ao transe. O experimentador
levanta o braço direito do experimentado por diversas vezes (00:04:03),
certamente testando se ele entrou em transe, outro procedimento consagrado como
teste para constatar a submissão do paciente. O que mostra que o experimentador
em questão é um hipnotizador experiente. A partir de 00:17:00, após outros
gestos e sons assemelhados a alguma prática mística, o hipnotizador passa a sussurrar
ao ouvido da testemunha, não se podendo compreender o que esteja sendo dito. Em
um instante desses, não se sabe que tipo de sugestão ou de indução foi dado,
tornando a regressão bastante frágil.
Novamente retirada do estado em que
se encontrava, a testemunha é esclarecida de que se tratou apenas de um teste
de suscetibilidade, o que também é aconselhável e serve para que a pessoa, em
outras tentativas, entre mais facilmente em transe. Outra evidência da boa
experiência do condutor. Colocado em transe profundo, e após novos sussurros,
é-lhe sugerido que retorne a 1998, 1997 e a 1996, ano do Caso Varginha. É raro
ver-se uma regressão com tão rápidos “retornos no tempo”, sendo que a gradativa
“volta” é mais aconselhável para que o experimento seja mais autêntico.
Em tentativas de aprofundamento do
transe, com imagens e outros tipos de sugestão, como sons da boca e estalar de
dedos, o vídeo é cortado por várias vezes ao sinal dado ao operador da câmera e a edição do vídeo
retorna com o hipnotizado sendo ainda mais aprofundado. Outro corte e a
testemunha começa a narrar sua viagem no ano de 1996 (00:27:11). Narra se
encontrar na estrada, que foi descansar em um motel e que seu destino é a
“Fazenda do Hélio”, em Três Corações, de propriedade de um amigo. Sua linguagem
é no presente, como se vivenciando mesmo fatos.
De repente diz estar na entrada de
Varginha, observando um dirigível ou avião, caindo. Dizendo-se parado em um
acostamento, uma baia para encostar o carro, vê um objeto soltando fumaça, “com gente dentro”. “Essa aeronave tá saindo fumaça dela”. Conta que o objeto perde altitude,
que cai e possui a lateral rasgada. E pequenas escotilhas. Que sai do carro
para observar melhor. Que o objeto desapareceu, voltou a subir e “desviou da cidade”, dizendo que o piloto
“é bom pra caralho”. O objeto, na
narrativa, passa a aparentar “um
submarino, uma coisa esquisita”. Emite um barulho “de uma máquina de lavar quebrada”. Demonstra pavor quando diz que o
objeto vai cair, chora (00:34:40). Na narrativa, passa a procurar um lugar para
entrar e ajudar quem estiver dentro do objeto, acha uma passagem para sair da
Rodovia Fernão Dias, por onde trafegava e lágrimas escorem no seu rosto. Sempre
falando no presente, o que é um sinal do “reviver” os fatos. Aos 00:35:51 volta
a chorar porque tem de ir lá já que tem gente dentro, supõe.
O auge da narrativa é quando diz se
aproximar do objeto caído, que solta um “cheiro
horrível”, sempre chorando e demonstrando pavor (00:37:42). Chorando porque
os olhos ardem muito em razão daquilo, fala em desespero com visível
desequilíbrio emocional. Relata vários destroços e que não há ninguém lá,
apenas ele. Que do outro lado aproximam-se caminhões. Pergunta do hipnotizador
– só caminhões? Aí ele fala em outros carros e os descreve como carros do
Exército e uma ambulância. São dois caminhões grandes e um Jeep. Aos 00:39:25
grita “Ei moço! Aqui! Aqui! Acidente”.
Às perguntas insistentes do
hipnotizador, sobre com quem ele estaria conversando, narra uma luz do lado
esquerdo “e um pequeno ser correndo”.
O ser é baixo, avermelhado, de olhos grandes (00:40:11). Pergunta do
hipnotizador, que não resiste interferir, talvez ele próprio influenciado por
suas convicções ufológicas – “Que
sensação o ser lhe traz? Traz medo, pavor?”. O ser passa então a falar “mentalmente” com a testemunha, no
sentido de que ele, o ser, tem de ir embora senão vão matá-lo. E que tem outros
que já fugiram dali. Diz o ser que já pediu ajuda, pergunta se pode ajudar mas
o ser avisa que não chegue perto e que irá ao rio pois precisa de água. O ser,
prosseguindo na narrativa, possui “três
protuberâncias na cabeça”, é oleoso e tem um cheiro muito forte.
Neste instante o hipnotizador joga
várias e insistentes perguntas, a respeito da constituição do ser, como ele
fala com a testemunha – que afirma que ele está correndo para o rio – e parece
voltar a dizer a alguém “Não moço! Não
vou embora não!”. “Tem gente que caiu
lá e sofreu um acidente. Caiu a nave, moço!” (00:42:32). Diz que pegou um
pedaço “da nave” que estava perto do
seu pé, insistindo que não irá embora pois quer ajudar e é por várias vezes
interrompido por perguntas do hipnotizador. Que a nave parece um charuto, com
uma metade encostada na árvore. Demonstra ter insistido com alguém que lhe
mandava sair dali, como se discutisse com veemência – “Não, você não vai me mandar embora”. “Por que você vai me matar? Eu não
vou embora!”. “Tá bom, moço. Eu vou”.
Com expressão de pavor, pede para que não atire porque vai embora. O pedaço,
que lhe foi retirado das mãos pela pessoa que o admoestava, parece um alumínio,
um “papel de frango”, diante de novas
insistentes indagações do experimentador.
Passa a ver um helicóptero escuro,
de um azul escuro, pousado (00:45:00) com um emblema da Marinha – “O que a Marinha
está fazendo aqui?”. E homens com máscara, alguns só com lenço na cara, porque
ninguém aguenta o cheiro. Diz que irá embora e informa que do lado direito há
bois agitados, correndo. Que do lado esquerdo não tem nada, um silêncio total.
Que a árvore em que o objeto está encostado está queimada. Pensa sobre o
objeto, cuja outra metade está em destroços, perguntando-se se seria algo do
Exército.
Aciona o carro, volta à Rodovia
Fernão Dias (BR-381, que liga Belo Horizonte a São Paulo), sente náuseas em
razão daquele cheiro e informa que voltará a São Paulo. Não há cortes no vídeo
e ele já se encontra em um posto, em sua viagem de volta, conversa com alguém
tentando dizer o que acontecera. Neste ponto não há um visível lapso de tempo
observável, pois que em poucos segundos ele já diz ter
parado no posto e não narra a saída de dentro do veículo. Então chegam “dois homens de preto, gravata, tudo
bonitinho... o que vocês querem?”. “Quem são vocês? Eu não devo nada pra vocês,
meu? E aí? E aí?, fala em tom elevado e desafiador. “E aí, sou eu mesmo... sou
casado sim, e daí? Vá se foder, mano!”. Gritando – “Qual que é a sua? Se toca, meu!”. “Eles estão me ameaçando! Que vão acabar com a minha vida! Que eu não
tenho nada a ver!”, continua em tom elevado, quase gritando. “Não! Não vai acabar porra nenhuma não, mano!”.
Informa então ao hipnotizador que
estão indo embora, em um veículo “Opala”, sem placa, com vidro filmado, escuro,
e passa a conversar com um garçom que lhe dera caneta para anotar a placa. Não
sabe o nome do garçom, descreve-o com cabelo curto, moreno baixo e isto já
seria por volta de seis horas da madrugada. Vai continuar a volta a São Paulo.
Na estrada, nervoso – as intervenções do hipnotizador são constantes, mas no
sentido de trazer mais as lembranças, “todas
as lembranças” sendo repetido o tempo todo – ele sobre o que seria aquilo.
Chegando em Guarulhos, ele dá um
salto de recordação sem obviamente o lapso de tempo. Ele salta para casa em
termos de lembrança, sob ordem do experimentador e narra à esposa o que
sucedera. O diálogo com a esposa obedece a uma sequência temporal própria. Porém
acontece um ponto da regressão de extrema relevância – o hipnotizador o leva ao
sono daquela noite, insistindo para que conte o que está vendo, o que está
acontecendo. Não há espera de que o hipnotizado caia em algum momento de
destaque. Diz que há o som em sua cabeça, o “som” do ser e fica muito agitado, acusando
dor intensa. O hipnotizador o relaxa e determina que a dor suma. Estranhamente
o experimentador interrompe e diz que ele informe sobre a primeira vez em que
comentou aquilo tudo com alguém de fora da família. Faz uma contagem para tal.
Menciona o nome de Claudeir Covo,
que vê em uma televisão quando o falecido ufólogo dá uma entrevista narrando os
acontecimentos de Varginha e “são eles”,
aquele ser que viu. Diz que viu “a nave
cair” (palavras do hipnotizador) no mês de Janeiro e que está vendo
Claudeir Covo na TV em Novembro. À pergunta de porque demorou tanto tempo para
procurar Claudeir, ou seja, meses depois, fala em “muita ameaça”. Conduzido ao momento em que conversou com Claudeir
Covo, que foi ao seu encontro em uma esquina da Vila Ema. Apesar de as
intervenções do hipnotizador se intensificarem, começa um diálogo com Claudeir,
obedecendo a tempo e a palavras correspondentes. Conta tudo como narrara
anteriormente. Menciona pela primeira vez que o cheiro era de amônia, de amoníaco.
No diálogo recordado com Claudeir, diz que coisas estranhas andam ocorrendo,
tais como vindo gente estranha em sua firma, que o telefone “vira e mexe parece ter linha cruzada”.
É agora conduzido até o dia em que
foi com o ufólogo ao local. Novas palavras e pausas correspondentes a diálogos
com ele, e diz que achava que se tratava de um Ovni, uma nave espacial, “tenho 100% de certeza”. Chegam ao motel em que dormira, brinca um
pouco e diz que Claudeir estaciona o veículo e vai à gerência consultar os
registros. Que Claudeir informa que acharam o registro da placa do carro, pergunta
se ele pegou uma cópia, o que fica sem resposta na regressão. Chegam à baia em
que encostara o carro do lado direito, mostrando as direções tomadas pelo
objeto. “A gente vai passar uma ponte e
logo em seguida, encostado nela”, há uma entrada em que passaram a
trafegar. “Está vendo que do lado
esquerdo há aquela casa branca, que reparei no dia”. “Olha isso, meu! Que barato! Não nasceu nada em volta! A árvore está
torrada! Cheiro esquisito essa árvore, né? Está seca! A marca é o formato de
uma bola de futebol americano, você vai tocar na árvore? Não tem mato em volta,
nem mato tem, tá morta a terra!”. Está com enjoo.
Sugere que saiam dali e se dirigem à
mencionada casa “lá embaixo”. Grita
como se Claudeir estivesse à porta da casa, e diz que uma pessoa está chamando
a família para dentro, que fechou a porta. Segue o diálogo - “E aí, Claudeir? Sério? O sujeito disse que
não quer falar com ninguém e que já foi o pessoal do Exército lá? Que ele não
tem nada para falar, que é para a gente embora senão ele vai chamar a Polícia?
[o que deveria ser narrativa, passa a ser repetição do que estava dizendo ao
ufólogo]. Sugere que encontrassem uma forma de ele dizer a verdade, saem e vão
a outra residência, próxima e ao lado um pouco mais à frente. Que o morador
escutara um tremor muito grande em um dia de Janeiro, que o gado ficara
assustado. Que a pessoa teve muito medo, que havia muito soltado lá. Claudeir
então diz, prossegue o hipnotizado, que o morador pediu que saíssem e que mais
nada tinha a dizer.
Continua dizendo que só contara à
esposa o ocorrido e depois apenas a Claudeir. Então o hipnotizador pergunta se
em algum outro dia chegou a conversar com o tal ser. Conta então sobre uma luz
forte no quarto, por volta de Junho de 1996. Uma memória aparentemente não
eclodida conscientemente, encontrada supostamente apenas com a regressão. “Tem uns seres baixos do meu lado... iguais
àqueles que...”. É interrompido pelo hipnotizador, com perguntas sobre
aonde se encontra. “Uma sala redonda”.
Perguntas constantes do hipnotizador, a respeito do que está fazendo ali. Que
está deitado, pergunta aos seres se aquele que vira era um deles. Estão
agradecendo por ajudar o amigo deles. Que são todos iguais, baixos, com mais ou
menos um metro e vinte, um metro e meio no máximo de altura. Têm olhos grandes,
boca pequena, sem nariz, só têm furinhos ou protuberâncias bem pequenas.
Perguntam a ele se podem colocar algo em sua perna esquerda, um objeto bem
pequeno e leva a mão à coxa esquerda, em que teria sido implantado o objeto.
Que vão tirar só daqui a pouco e puseram aquilo para que o hipnotizado pudesse
ajudar a fazer as pessoas entenderem e “não
acontecer mais aquilo”.
Subitamente informa que os seres lhe
disseram que “mataram ele”, ou seja o
ser com quem contatara no dia da queda. E grita, chorando “O que? Eles mataram ele? Mataram, os filhos da puta!” “Malditos!
Malditos!”. Grita, chora e é acalmado pelo hipnotizador. Que eles mataram “os amigos deles”. O que foi colocado em
sua perna é “para que eu me recorde, para
que eles possam entrar em contato”. Diz estar em uma sala branca, deitado
sobre uma mesa, que eles deixarão o objeto em sua perna por apenas uns dois ou
três meses.
Que “várias vezes” entrou em contato com eles, deitado, sentia a
presença deles e era então levado. Que depois que contou ao Claudeir, eles
retiraram o objeto de sua perna. O condutor pergunta se depois que falou com
Claudeir aconteceu algum fato marcante. Narra então um pedido para que os seres
retirassem o objeto de sua perna, que não queria saber mais disto, que temia
que “esses animais” [referindo-se a
perseguidores] fizessem com sua família “o
que fizeram com vocês”.
Entra em cena o que parece vir da
linha de pensamento do hipnotizador, que pergunta se ainda ficou alguma forma
de contato com os seres. “Se eu pensar,
vocês vêm? Vêm?”. O condutor sugere aprofundar “dez vezes mais o relaxamento”, “trazendo
agora todas as recordações...”. E se aproxima do ouvido direito do
hipnotizado sussurrando algo inintelitível. Parece fazer uma contagem. O sujet sofre uma espécie de rápido
espasmo, como em um susto e é novamente acalmado. E acontece o auge da
influência – “Você gostaria de chamar, de
conversar com eles agora? Eles viriam?”. Permanece muito calmo, em
silêncio, também sussurrando, repetindo algo como “... as estrelas...”. O hipnotizador, tal como fizera durante todo o
tempo da sessão, passa a emitir um chiado com a boca, esfregando polegar e
indicador próximo à cabeça do hipnotizado, iniciando espécie de passe movendo a
outra mão na região do abdome, mas sem tocar. Um gesto com aparência de prática
mística, ou insinuante do trato com alguma “energia”, ou “campo”, ou “ponto”supostamente
existente no corpo humano. Esse procedimento passa a ser insistente naquele
instante da regressão.
Aos 01:20:13 o hipnotizador passa a
se comportar claramente com o que pode decorrer de suas crenças, efetuando
verdadeiro Passe [gesticulação por imposição de mãos em uma pessoa, à maneira
da prática espírita] sobre todo o corpo do hipnotizado, sem tocar. Espalha os
gestos desde a cabeça até os pés, abrindo e fechando os braços. Começa, mais
vagarosamente porém com firmeza, a gesticular como se estivesse “retirando” ou
“limpando” algo, desde a cabeça até os pés, do hipnotizado que se mantém em
silêncio, olhos fechados, ainda em transe. Novos sussurros por parte do
hipnotizador, ininteligíveis. São incompreensíveis e então dá ordem sussurradas
de que ele erga as duas pernas, o que acontece vagarosamente e após mais gestos
na região dos pés, sempre sem tocar. Mais sussurros e agora os braços sobem.
Com rápidos e repetidos toques na barriga e no peito do experimentado, o
hipnotizador passa a emitir um som gutural correspondente, na forma de
grunhido. Geme muito e alto, o experimentador, que passa a emitir um gemido
constante e agudo, prolongado, enquanto apanha ambos os pés do hipnotizado e os
sacode por vários segundos, fazendo agitar-se todo o corpo dele.
Todo esse tipo de procedimento
acontece até 01:25:20 do vídeo, quando outro corte de edição é percebido. Novos
sussurros ao ouvido do hipnotizado, sempre acompanhado dos gestos que aparentam
passes. O experimentador encerra a regressão, após o mencionado corte, faz a
testemunha voltar ao estado normal de consciência. Tudo se encerra aos
01:27:51, com novo relaxamento e a testemunha mostrando bem estar geral,
preguiça e bom humor.
Comentando
sobre a Regressão
O depoimento da testemunha em questão é
flagrantemente contraditório com o que declarou aos investigadores em ufologia,
à época em que resolveu procurar o ufólogo Claudeir Covo. Diz-se do depoimento
em transe. Quando procurou o ufólogo,
este comunicou o fato a Ubirajara Rodrigues que, seguindo as diretrizes
fornecidas, foi até o local acompanhado de Geraldo Simão Bichara, o
protagonista de um outro caso de abdução também tendo como palco Três Corações
no ano de 1962. Passaram por algumas casas da região e constataram que não
havia quem presenciara alguma queda, ou mesmo vôo incomum de algum objeto e
muito menos ruídos ou estrondos. Claudeir Covo nunca esteve no local
acompanhado somente da comentada Testemunha, como esta afirma na regressão
hipnótica. A primeira vez em que esteve no local da alegada queda estava
acompanhado da testemunha, do ufólgo Ubirajara Rodrigues, do citado Geraldo
Bichara e do filho mais velho de Rodrigues. Ainda no ponto da Rodovia Fernão
Dias, em que a testemunha diz ter avistado o objeto em voo e em dificuldades,
os dois ufólogos gravaram em vídeo um depoimento da testemunha, que foi
amplamente divulgado e, aí sim, dirigiram-se ao local do dito acidente. Pelo
que se sabe, Claudeir somente retornou até ali quando de uma operação “pente
fino” que vários ufólogos fizeram no pasto, e daquela feita sem a presença da
testemunha.
Incompreensível assim que a testemunha tenha
omitido, durante quase trinta anos, que fora ao local em uma primeira ocasião
com Claudeir Covo, que de sua parte também certamente não teria escondido tal
fato dos demais investigadores, muito menos do primeiro, de quem aliás fora
parceiro em outras investigações de casos ufológicos, ambos tendo inclusive
escrito alguns trabalhos em co-autoria. A relevância disto reside na
possibilidade, na hipótese, de que a testemunha tenha TEATRALIZADO durnate sua
regressão de memória. O que parece acontecer, em tese, devido a algumas outras origens.
Um hipnotizado
teatraliza por diversos motivos, não apenas intelectuais (mentir, inventar,
aumentar), como principalmente de ordem psicológica ou emocional (ânsia de
participar ou protagonizar um evento e outros fatores). A teatralização na
hipnose regressiva corresponde ao que ocorre em sonhos, ainda que o transe
hipnótico não seja propriamente um sono fisiológico. É o que a linha freudiana
chama de Dramatização, que
ocorre na elaboração de um sonho. É sabido que a dramatização é notada nas
reações e atos da pessoa durante o transe hipnótico, principalmente na
Regressão. Ou seja, dramatizar tal como em um sonho é a
maneira com que a psique trabalha perante suas situações internas. O sonho é
uma forma de a pessoa formar enredos através da transformação de suas ideias em
imagens. Essa criatividade na dramatização ocorre de forma ampliada no “sono”
hipnótico.
Ideias, imagens, crenças, convicções, fortes
impressões, tudo isto compõe o universo da mente de uma testemunha de caso ufológico,
principalmente após tornar-se protagonista em veículos de comunicação, que
tenha elevado ao extremo a importância de sua participação, exatamente como
ocorreu com a testemunha comentada neste trabalho, com destaque à atuação no
documentário internacional também já mencionado.
A regressão de memória sob análise iniciou-se
com boa técnica, foi a pessoa induzida a transe profundo, sempre narrou
situações no presente, com coerente utilização de tempo verbal (de quem
descreve algo que está revivendo e não apenas se lembrando). Seus eventuais
rompantes de desequilíbrio emocional, com choros, tom elevado de voz e gritos,
parecem demonstrar a dramatização e ênfase com o fito de convencer o
hipnotizador ou a si mesmo, o que não é absurdo e ocorre amiúde.
Sinal da ânsia de convencimento continua
sendo a utilização do nome do falecido ufólogo Claudeir Covo, de longe o mais
respeitado estudioso da matéria das duas últimas gerações de investigadores
ufológicos. Ao narrar que retornara ao local em companhia dele – o que,
conforme destacado, não aconteceu – em tal primeira viagem teriam estacionado
no motel em que ele havia parado para dormir. Claudeir teria ido até a
gerência, confirmado que a placa do veículo estava anotada no dia alegado, e,
ao se perguntar na regressão se o ufólogo havia tirado uma cópia... tudo parou
ali. Não foi mencionado sequer o nome do motel. Este é outro ponto controverso.
Covo jamais informou isto a qualquer colega ou à Imprensa, e mais essa omissão
teria sido inadmissível, diante da vontade dos ufólogos de apresentar o maior
número de indícios possível, notadamente documentos que pudessem corroborar
certas afirmações de testemunhas.
Desde seu primeiro diálogo com Covo, e
durante a primeira ida ao local com as pessoas citadas, a testemunha afirmara
que “ia para Uberlândia” se encontrar com um pessoal que participaria em Belo
Horizonte de um festival de ultraleve, ao passo que Uberlândia se encontra bem
na região do Triângulo Mineiro, muito distante do Sul de Minas e desafiando uma
trajetória totalmente diferente para quem vem da Capital de São Paulo. Esclarece,
por outro lado, que iria para Uberlândia de onde voltariam a Três Corações e de
lá partiriam para Belo Horizonte, aonde ocorreria o festival. Agora na
Regressão de Idade, vem de alegar que iria para a “fazenda do Hélio”, de
propriedade de um amigo em Três Corações. Situações contraditórias e, em
termos, incoerentes. Digne-se o leitor de consultar um simples mapa de Minas
Gerais.
Não bastasse, entre o que a testemunha
declarou aos ufólogos em 1996, depois em outras poucas entrevistas com ênfase a
uma de 2015, posteriormente ao produtor e diretor do documentário
norte-americano, e finalmente na Regressão de Memória, as alterações de
informação também são notáveis. Nunca mencionara o pequeno ser, tampouco que
chegara ao local da queda onde havia apenas o objeto acidentado e minutos
depois é que foram se surgindo viaturas e soldados. À época, disse que chegara
ao local e já se encontravam vários soldados catando destroços. Apenas a partir
do depoimento no documentário e durante a Regressão, falou em uma árvore
queimada, em que se encostava “uma metade” do artefato enquanto a outra parte
fora destroçada. Nem acusou desde 1996 que no pasto ficara uma marca
arredondada ou ovalada, também de material queimado e em cuja periferia nada
nascia. Nem quando esteve no local com os dois mencionados ufólogos.
Estranhamente o hipnotizado omite, por sua
vez, a ida ao local – única até então – em companhia de Claudeir, de Rodrigues,
do filho deste e de Bichara. O que foi devidamente registrado e divulgado
intensamente nos meios ufológicos e ocasionalmente na Imprensa. Uma forma de
salvaguarda para valorizar a ida apenas de ambos, não acontecida,
principalmente para dizer que alguém nas casas próximas havia ouvido um
estrondo, sentido tremor e outro tinha sido ameaçado por “gente do Exército”? É
apenas possível. Para tristeza e consternação da ufologia brasileira, as
declarações de Claudeir jamais poderão ser pessoalmente retomadas...
Quando do trabalho de busca naquele pasto,
por 14 ufólogos, de algo que pudesse dar indício ao pouso ou queda de alguma
coisa, alguns resolveram ir até as mesmas casas de fazendas e conseguiram
apenas a declaração de que nada havia sido avistado ou sentido. Nenhum morador
se portou com receio ou informou qualquer tipo de perseguição e muito menos
“ameaça”. Consta do livro de Ubirajara Rodrigues, “O Caso Varginha”, CBPDV,
Campo Grande, 2001, p. 126, que “Consultado, o proprietário
das terras, senhor Sebastião Maiolini, afirmou que nada de anormal se passara em sua propriedade, o que foi
confirmado pelo filho. Deve-se,
inclusive, ressaltar que a menos de um quilômetro do ponto da alegada queda existe
um modesto templo
evangélico e os responsáveis também afirmaram nada haver notado”.
Não basta estar o hipnotizado em transe
verdadeiro, para evidenciar que esteja falando da verdade objetiva, de uma
realidade externa e portanto não inventando sua história? Não, não basta. Além
do que foi comentado ao início, a Regressão de Memória está longe de se prestar
a tal comprovação. E aqui acabamos de mencionar mais um dos inúmeros fatores –
a dramatização, uma teatralização que pode ocorrer por diversas causas
psíquicas. Não se está, proposital e conscientemente, tratando nem afirmando
neste trabalho algum tipo de má-fé, ou de construção mentirosa da história, por
parte da testemunha. Não. O objetivo principal é enfatizar unicamente a
Regressão de Memória e suas implicações.
Que se encontrava em transe autêntico é o que
tudo indica, porém com nítidas oscilações ou variações de nível. A hipnose foi
aplicada gradativamente, com relaxamento físico e mental, contagem regressiva
em diversos momentos, o que é da boa prática para tentar manter a pessoa no
fato revivido. O hipnotizado parece dar o tempo correspondente a algum suposto
interlocutor, durante os diálogos descrito. Em muitas ocasiões, no entanto,
frisa o que era relevante, espontaneamente, mais no tom de informação do que de
nova vivência. Há portanto uma oscilação no transe. Convém observar que a
sessão foi relativamente longa e o vídeo que a registra tem cortes, pelo que
ela certamente durou mais do que uma hora e vinte e sete minutos. É garantido
nesses casos, apesar dos cuidados de aprofundamento pelo hipnotizador, que a oscilação
leve o indivíduo a nível de pleno estado normal de consciência ou transe leve.
Momento propício para frisar que, depois dos primeiros passos da indução, o
hipnotizador aparentemente não realizou qualquer teste de transe na testemunha.
São testes objetivos, conhecidos de todo aquele que lida com a Hipnose.
Inclusive durante o estado correspondente a transe profundo, o que deveria ter
sido realizado com muita atenção.
Contudo, conforme pontuado no tópico
anterior, as intervenções do hipnotizador se multiplicaram, tendo o silêncio do
experimentador permanecido mais durante a fase inicial do transe e um pouco
durante o transe médio. À medida em que o hipnotizado foi narrando o momento em
que chegara ao local da queda, já em transe profundo, as interferências foram
se intensificando, com interrupção da narrativa em vários momentos. O
hipnotizador parece não ter resistido à parcialidade quando, como bom ufólogo
adotante da ideia da abdução e dos contatos telepáticos com ETs, inicia uma
série de gestos aleatórios, correspondentes a uma espécie de “campo invisível”
que cercaria o corpo do sujeito. Em verdadeiros passes (“magnéticos”, conforme
os adeptos de Franz Anton Mesmer admitem), o que faz por mais de cinco minutos
com o sujeito em silêncio, insiste por esses meios que ele informe sobre
abduções ocorridas durante o sono.
O hipnotizado, ao narrar essas abduções, ocasiões
em que era levado ao interior de algo, colocado em uma sala branca e deitado em
uma espécie de maca, conta de conversas telepáticas com os seres estranhos que
o cercavam, baixos, olhos escuros e grandes, que resolveram implantar algo em
sua coxa direita, que somente seria tirada dois ou três meses depois, o que no
entanto ocorreu antes de a testemunha ter procurado o ufólogo Claudeir Covo. Aqui
outra contradição. Antes dissera que isto acontecera depois que procurara o
ufólogo. Conveniente? Se positivo, o psiquismo da testemunha deve ter lá suas
razões, quiçá de salvaguarda.
O hipnotizado está mentindo? A regressão
mostra que a criação da história pode ter sido enriquecida após quase trinta
anos, como dito, de ele acompanhar a intensa divulgação do caso pela Imprensa,
afirmações incontidas de ufólogos e, principalmente, da importância que alguns
desses, e outros, lhe conferiram. Uma realidade apenas subjetiva não significa
mentira, que é um ato praticado com má-fé ou má intenção, com intuito de tirar
proveito. Algumas testemunhas necessitam do reconhecimento em casos rumorosos
de ufologia. Passam por previsíveis fases – inicialmente sentem surpresa, ou
horror, receio, em razão do choque psicológico, emocional. Depois a alteração
emocional se transforma em espécie de defesa, quando a testemunha deseja
colaborar com os investigadores e se vitimiza, alegando que é explorada, que não
tem retorno financeiro. A última fase é a de estrelismo, quando ela passa a se
achar arauto de seres evoluídos, ou intermediária de ETs e habitantes da Terra,
transmitindo mensagens e tornando seu discurso nitidamente messiânico.
Essas fases estão presentes em todas, sem
exceção, as testemunhas de casos ufológicos famosos.
Não existe situação mais incisiva dessa última fase, do
que a testemunha se achar contatada com extraterrestres, pela forma telepática
e no recôndito discreto e único de uma abdução durante o sono. É sem embargos
uma produção das crenças da testemunha na área... e principalmente das crenças
do ufólogo, ou do investigador, ou do hipnotizador, ou do terapeuta... com a
palavra a citada Elizabeth Loftus, de quem sugerimos a leitura de “A Ciência da Falsa Memória”, pela Oxford
University Press (Brainerd & Reyna, 2005). E “Criando Memórias Falsas”, Scientific
American September 1997, vol 277 #3 p. 70-75, cujos excertos foram
publicados em https//doceru.com/doc/sc5cve.
Testemunhas se
enganam e se iludem, com relação ao que cerca as ideias em torno do fenômeno
UFO (UAP). Exemplo claro é a ideia de que um contato com extraterrestres
geralmente provoca, ativa, ou cria, fenômenos paranormais na testemunha. Isto
nunca foi provado. Ao contrário, os raros casos que são influentes ao extremo,
só mostram crença mística de que isto acontece e, de se lamentar, pela ação de
paranormais claramente farsantes, que inventam histórias para fantasiar as
mentes de incautos no sentido de que seus “poderes” foram dados pela ligação
com o fenômeno.
Por outro lado, os
tais contatos telepáticos – nunca, jamais, um contatado logrou demonstrar seus
alegados contatos – simplesmente não podem ser referendados pela ausência da
principal e maior premissa. A de que nunca foi provado sequer que a telepatia
existe, nem mesmo nas decantadas experiências do casal Rhine na Duke University
da Carolina do Norte, na década de 1930. O que já torna bem frágil a afirmação
de uma testemunha, de que passou a se comunicar “telepaticamente” com supostos
ETs. Contudo tais equívocos povoam as mentes de testemunhas, que passam a
devaneios ou a fantasias acreditando que certas situações já estejam provadas.
É como também age a maioria dos ufólogos, isto é, falou UFO falou nave
extraterrestre e essa premissa para eles é indiscutível.
Quanto aos
providenciais sussurros ininteligíveis, proferidos pelo hipnotizador, aos pés
do ouvido da testemunha, é bom que se frise também que este trabalho não tem
como foco algo produzido propositalmente pelo experimentador, no afã de provar
suas próprias crenças, inclusive de que a Regressão de Memória sirva à
comprovação do que quer que seja. Não, em absoluto. Mas convém destacar, a bem
da transparência, que assim agindo o hipnotizador corre total risco de ser
interpretado em desfavor da autenticidade do que o sujeito narrava. É simples
questão de raciocínio objetivo, sendo aqui, fosse o caso, perfeitamente
aplicável o conhecido princípio alcunhado de Navalha de Occam. A explicação
mais racional e viável, é a mais simples, o seja, aquilo que melhor possa
transparecer.
Una-se aos
sussurros a gesticulação de aparência mística, ou praticada por alguma corrente
esotérica ou religiosa, tais como passes e representações de se estar
“retirando” algum tipo de “energia” do corpo do sujeito, ou mesmo “abrindo
certos pontos” para a maior fluência de lembrança (sic). As aspas são
exclusivamente daqui e não retratam falas do hipnotizador sob comentário. A
regressão aqui discutida teve um ápice de ilusões em seu último ato. Após
vários “passes” e gesticulação de ordem mística, o hipnotizador pergunta (ou
sugere) que a testemunha tente um contato telepático naquele instante, ou
“chame” os seres, com novos sussurros ininteligíveis aos ouvidos. O contato não
aconteceu e o hipnotizado voltou do transe, quando retirado pelo condutor.
Esperando que o
leitor se reporte ao tópico que descreve a regressão, o que resta é observar
que jamais, durante os 27 anos passados até a presente data, a testemunha
mencionou ou insinuou ter visto um pequeno ser que saía dali, que
telepaticamente lhe informara que outros já haviam se evadido e que corria em
direção “do rio, pois precisa da água”. Muito menos que seus contatos
telepáticos prosseguiram com o passar dos anos, com a informação de que seres
teriam sido mortos por alguém e que havia sido implantado com algum artefato
inserido em sua perna direita. Convenientemente retirado antes de ele entrar em
contato com o maior e melhor ufólogo, infelizmente já falecido, que não
titubeava em tomar qualquer critério lícito para estudar um caso que lhe caía
às mãos. Este nunca mencionou também que lhe fora sequer insinuado pela
testemunha que ocorrera algum implante na perna.
Visíveis
influências de tudo o que foi visto, ouvido ou percebido pela testemunha, a
respeito de casos ufológicos, mormente do Caso Varginha. Sem se falar no fato
de o hipnotizador, ao incutir frases como “mais lembranças, todas as
lembranças”, ter insistido com o hipnotizado de que “mais e mais” supostas
lembranças começassem a ser elaboradas. A questão da água foi largamente
tratada, como meros e aleatórios indícios é certo, no livro de mesmo título,
mencionado atrás. No livro as narrativas da testemunha recebem algumas páginas
de atenção. Implantes sempre foram comentados na imprensa ufológica, e aquele que
era a maior autoridade no tema, o médico americano Roger Leir, esteve por três
vezes em Varginha, mencionando como sempre seu trabalho com supostos implantes
por extraterrestres. O Rio Verde, apesar de fluir pelas cidades de Três
Corações e Varginha, passa a 10 km., em linha reta, do local em que a
testemunha disse ter presenciado a queda. Com a colaboração do ufólogo Weslem Andrade constata-se que o rio mais próximo dali é o Rio do
Peixe, que de fato cruza a Fernão Dias com a ponte indo além do local, no
sentido Belo Horizonte. E se encontra a 5 km., também considerando-se linha
reta. ETs que “precisam da água”, que pudessem transpor tais distâncias, após a
queda de seu veículo voador, ainda que tentassem o itinerário passando por
morros, matas e fazendas, deveriam ter uma resistência que causa inveja a
alguém como o ator Sr. The Rock.
Equivoca-se o interessado que julgar
ser uma regressão desse tipo uma perda de tempo, ou algo que apenas descompõe
ou tira o incentivo à investigação ufológica. Ao contrário. É um excelente
exemplo, um ótimo foco para estudo de caso, para a evolução dos debates e dos
experimentos ufológicos, ainda latentes nos recônditos da pura ilusão, incipientes
e por enquanto quase totalmente desconexos.
Curitiba, Fevereiro de
2023
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