Agora que Jacques Vallée voltou aos
noticiários (de novo) depois de ser escolhido para se juntar ao Projeto Galileo
do Dr. Avi Loeb, é instrutivo revisar alguns de seus escritos anteriores. O
pesquisador Curt Collins aponta que Vallée foi nomeado para a “Equipe de
Pesquisa” do Galileo, que é maior do que ser um mero “Afiliado de Pesquisa”
como os outros ufólogos do Galileo (Luis Elizondo, Nick Pope, Chris Mellon,
Robert Powell, Gary Voorhis). Você viu quantas pessoas estão agora listadas no
site do Galileo, em várias posições? Eu não contei, mas fiquei surpreso ao
encontrar dezenas!
Eu tive duas resenhas de livros
publicadas na edição de primavera/verão de 1977 da revista The Zetetic
(que mais tarde se tornaria The Skeptical Inquirer): uma é do livro The
Invisible College [O Colégio Invisível], de Hynek e Vallée, que publicarei
futuramente. A segunda parte trará respostas de Hynek e Vallée.
Não se engane, sempre foi Vallée que
puxava Hynek para cada vez mais longe, e não o contrário.
Resenha de Robert Sheaffer do livro The
Edge of Reality: A Progress Report on Unidentified Flying Objects [O Limite
da Realidade: Relatório de Progresso sobre os Objetos Voadores Não
Identificados] [1977]
Não é sempre que se encontra um livro
escrito por dois cientistas treinados que promete levar a pessoa ao “limite da
realidade”. Essas viagens, é claro, são ocorrências diárias para aqueles que
moram nas obscuras meta-regiões do ocultismo, mas representam um caminho escuro
e inexplorado para aqueles que foram treinados nos métodos exatos das ciências
físicas. Assim, não é surpresa ver que os autores J. Allen Hynek, um astrônomo
da Northwestern University e ex-consultor da Força Aérea sobre OVNIs, e Jacques
Vallée, um cientista da computação que também é formado em astrofísica, se
consideram pioneiros. O livro começa com um aviso severo para aqueles que acham
todas as novas ideias “tanto assustadoras quanto uma ameaça à sua segurança
intelectual” (esta é, obviamente, a única razão possível pela qual alguém pode
não acreditar em OVNIs). O objetivo dele é tornar Galileu, Einstein e Daniel
Boone em uma única pessoa, para “abrir perspectivas inteiramente novas” em um
universo invisível. Na verdade, nada menos que um universo totalmente novo nos
espera, pois é a modesta intenção dos autores mostrar como os OVNIs, percepção
extrassensorial e viagens extracorpóreas estão “sinalizando que há uma
realidade que os cientistas... não estão conscientes, mas que existe!”
Seria de se esperar que os cientistas
abordassem uma região tão selvagem e indomável com infinita cautela. Se espera
por isso, ficará desapontado, pois os autores engoliram alegremente um número
assustadoramente elevado de fraudes de OVNIs. Sobre a suposta abdução de dois
pescadores do Mississippi em 1973, Hynek afirma: “Os homens não estão mentindo.
Estou bastante convencido disso”. Então, por que a testemunha principal recuou,
no último momento possível, de sua promessa pública de fazer um teste de
polígrafo durante uma conferência de ufologia em 1975? Essa promessa só foi cumprida
com relutância depois que o cético dos OVNIs Philip J. Klass revelou que um
teste de polígrafo anterior, no qual a testemunha aparentemente havia passado,
tinha na verdade sido um trabalho “rápido” de vinte minutos, conduzido por um
operador não licenciado e não certificado trazido de fora do Estado. Não
importa esses detalhes: a testemunha havia “passado no teste do polígrafo”, e
isso é evidência suficiente para Hynek.
As supostas fotos de OVNIs tiradas em
McMinnville em 1950 estão incluídas no livro como aparentemente autênticas,
apesar do fato de que as testemunhas demonstraram ter falsificado a hora do dia
em que as fotos foram supostamente tiradas. Os supostos poderes “paranormais”
do contatado Uri Geller, o israelense Cagliostro, são citados como evidências
convincentes da realidade daquela terra de fantasia supostamente situada além
do “limite”, apesar das demonstrações de James Randi e outros de que Geller é
apenas um fraudador inteligente. E ambos os autores estão convencidos da
autenticidade do suposto pouso de OVNI que ocorreu no Kansas em 1971, embora a
principal testemunha posteriormente tenha relatado avistar, entre outras
coisas, “a Menina Lobo”. Fica-se com a sensação de que se Hynek e Vallée
investissem em imóveis, sua primeira compra provavelmente seria a Ponte do
Brooklyn.
Os autores são tudo menos tímidos.
(Mesmo o formato do livro não é convencional: a maior parte consiste em
transcrições das conversas dos autores.) Eles não tentam fugir da óbvia
inconsistência interna do fenômeno OVNI, como os ufólogos “científicos”
costumam fazer. Em vez disso, eles enfrentam o absurdo de frente. Vallée admite
que o comportamento relatado dos OVNIs “não é consistente com o que você
esperaria de visitantes do espaço, ou com o que sabemos sobre física. Daí o
dilema.” Como resolvê-lo? Simples: primeiro, levantamos a hipótese de que os
OVNIs estão vindo de algum lugar fora do espaço (?), e então acabamos com a
física.
Com esse dilema bem resolvido, Hynek
gosta de contar histórias sobre os feitos “paranormais” de um curandeiro índio
sioux, sobre o qual um amigo dele ouviu falar enquanto visitava uma aldeia
indígena. Vallée prefere falar sobre elfos e elementais, e homens pretos e
vermelhos, que podem ser vistos apenas por sua filha de três anos. Vallée
confessa que uma vez pensou que os homens, que vivem em casas mal-assombradas e
brincam com fantasmas, eram apenas fantasias de infância. Mas, aparentemente,
as descobertas de sua pesquisa ufológica agora não são menos bizarras do que os
companheiros invisíveis de sua filha. Vale tudo quando sua hipótese de trabalho
se torna “universos interpenetrantes”. Os autores podem, com razão, sentir
orgulho de seu trabalho, pois conseguiram formular a hipótese científica ideal:
não importa o que possa ser descoberto no futuro, seu esquema de “universo
paralelo” nunca poderá ser refutado!
Vallée e Hynek também confrontam
diretamente a questão complicada de como os OVNIs sempre conseguem escapar antes que a
evidência de sua existência se torne muito convincente. Os “contatos imediatos”
com OVNIs parecem ocorrer em áreas isoladas, e os supostos “vestígios físicos”
de suas visitas são sempre inconclusivos. As fotografias nunca são claras e
convincentes e, invariavelmente, apenas um fotógrafo está presente. Se os OVNIs
fossem de fato objetos reais, dado o grande número de avistamentos relatados, é
inconcebível que evidências conclusivas de sua existência já não tivessem sido obtidas
a essa altura. Hynek tem uma resposta para essa objeção: “O OVNI é o que foi
chamado de ‘fenômeno ciumento’”. (Assim chamado por quem? Por este crítico.
Apresentei a ideia a Hynek quando era estudante na Northwestern.) O Boeing 747
não é um fenômeno ciumento, um eclipse não é ciumento, qualquer um pode
observá-lo, mas um OVNI é um ‘fenômeno ciumento’ porque parece estar localizado
no espaço e no tempo.” E, assim, outro problema foi resolvido, da melhor
maneira medieval: assim que um nome é inventado para cobrir alguma observação
intrigante, a explicação está completa. Hynek opta por ignorar o argumento que
apresentei ao explicar o significado desse conceito: quando um fenômeno parece
ser “ciumento”, como OVNIs, percepção extrassensorial e o monstro Pé-Grande,
brincando de esconde-esconde com o mundo da realidade objetiva, isso é a
indicação mais forte possível de que isso existe apenas na imaginação
superativa de seus investigadores.
O livro The Edge of Reality
[No Limite da Realidade] está cheio de erros de fatos, muitos deles pequenos,
mas ainda assim revelam a erudição excepcionalmente descuidada dos autores.
Todo mundo que lê o livro parece encontrar um pouco mais. Por exemplo, os
autores afirmam que “passam anos sem um único acidente [de avião]”. Philip J.
Klass pesquisou: houve pelo menos um acidente aéreo fatal nos Estados Unidos em
cada ano recente, um total de 24 nos últimos cinco anos. O escritor
aeroespacial James Oberg achou curioso que o Mercúrio 9 fosse lançado antes do
Mercúrio 8, o que deve ter sido se a cronologia dos “OVNIs astronautas” do
livro estiver correta. Diz-se que gravações em fita estão “na Biblioteca do
Congresso” quando na verdade não estão. E o diretor do Observatório Dearborn,
em 1897 — George Washington Hough, o próprio antecessor de Hynek — não foi seu
primeiro diretor, como se afirma. É esse o tipo de conhecimento que se espera
que nos convença a revisar nossos conceitos sobre a própria natureza do
Universo?
Sobre os céticos, Hynek diz: “Os céus
sabem que precisamos deles para manter um equilíbrio adequado”. Por esse
padrão, o Centro de Estudos de OVNIs, do qual Hynek é o fundador e diretor, é
uma organização muito desequilibrada, pois nem um único cético pode ser
encontrado entre seus principais investigadores ou em seu conselho científico.
Ervilhas em uma vagem se acotovelam mais do que essa equipe de mentalidade
semelhante. O desdém dos autores pela opinião crítica é declarado abertamente
em outras partes do livro:
Vallée: Temos que dar um dia no
tribunal para o homem que acredita que é tudo bobagem? Hynek: Inferno! Alguém
poderia gastar toda a sua energia confrontando os céticos... Por que perder
tempo com pessoas que não se preocuparam em aprender os fatos básicos? É
problema deles!
Classificar todos os céticos,
incluindo investigadores experientes como o falecido Donald Menzel e Philip
Klass, como “pessoas que não se preocuparam em aprender os fatos básicos” é
nada menos que uma falsidade ultrajante. Hynek deveria se desculpar
publicamente por ter publicado tão imprudentemente acusações tão tolas. Aqui
vemos o princípio não declarado sobre o qual o centro “científico” de estudo de
OVNIs opera: A crítica responsável não existe. Dúvidas e discordâncias são
invariavelmente ignoradas. Cartas de indivíduos responsáveis (mas indesejáveis)
permanecem sem resposta. Os resultados das análises de OVNIs nunca são
divulgados publicamente. (Por que dar tal informação a qualquer um?) Assim, a
operação do centro veio a se assemelhar muito à concepção de um buraco negro
dos astrofísicos; não importa quanto material caia nele, nada escapa. No
entanto, os autores acusam descaradamente todos os outros grupos de estudo de
OVNIs de “realmente esconder informações em vez de revelá-las”! “Eles publicam
apenas o suficiente para estimular o interesse de seus assinantes”, acusa
Hynek, cujo grupo não publica praticamente nada, enquanto implora a seus
assinantes que se tornem patronos com a doação de mil dólares. “Eles se
transformam em uma organização de relações públicas”, diz Vallée sobre todos os
grupos de estudo de OVNIs, exceto o seu.
Nenhum encontro ou conferência
organizada pelo Centro de Estudos de OVNIs jamais incluiu a voz dissidente de
um único cético. (A posição pró-OVNIs é totalmente indefensável?) O castelo de
cartas que Vallée e Hynek construíram sobre uma base de evidências de boatos,
erudição descuidada e negligência da metodologia científica rapidamente
desmoronaria no ar turbulento do debate científico aberto. Tendo se esforçado
tanto para se isolar de todas as críticas responsáveis, não é difícil ver por
que os autores agora cambaleiam tão precariamente no “limite da realidade”.
*
* *
Tradução: Tunguska
Fonte: badufos